A vida está permeada de caminhos tortuosos nos quais somos impelidos ao desenvolvimento. Avançar significa transpor uma força gravitacional. Uma semente, por exemplo, quando emerge das profundezas da terra, já lutou muito com a gravidade. Essa luta interna também faz parte de nós, pois assim como o broto que vence essa energia, almejamos a existência e o reconhecimento. Reivindicar o direito de existir pressupõe paciência, resignação sob aquilo que somos, isto é, ninguém detém dos mesmos atributos para caminhar na senda da jornada evolutiva, pois cada um é único e possui as experiências que o constitui. Crescer e evoluir são imperiosos para quem está com os pés sob o orbe terrestre, mas só é possível quando tornamo-nos receptivos aos sinais que nos chegam por meio de diferentes lugares. Muitas pessoas são sinais da vida para nós, são adubos que fortalecem as raízes que se formam para sustentar e nutrir a nossa alma, porém, carecemos de sensibilidade para acessá-las, para depois da confiança, interpretá-las. Cada um traz subjetividades complexas produzidas por diferentes fatores, que somente com o passar do tempo, com a atenção aflorada, confiança e tranquilidade, são permitidas as leituras além-corpos. Ler com o olhar atento é ir a mais, é transpor as linhas que podem se materializar no óbvio. Por isso, evoluir não significa ausência de dores no caminho, ao contrário, não se aprende a andar sem antes engatinhar e cair, e isso, são processos doloridos porque saem da zona do conforto natural a que se está acostumado. Engatinhamos ainda em muitas coisas, nos sentimentos com os outros, com nós mesmos e na brutal competição social que se instaura na atualidade, torna-se mais comum a banalização do que é ou algum dia foi humano; isso faz a alma sentir dor, porque não fomos criados para espezinhar o outro, mas, para ajudá-lo a tornar melhor a existência. Nascer não se é possível sem antes chorar, mesmo quando somos arrancados da proteção uterina por meio de uma intervenção humana, sentimos a dor da alma por entrar num mundo conflituoso; dor e lágrimas são irmãs gêmeas na maioria das vezes em nossas elucubrações e fazem parte da existência. As lágrimas metaforizam o curso de um rio que segue o percurso, vai livre aonde quer e isso não se pode controlar. Esses mecanismos de uma maneira simbólica podem representar a limpeza daquilo que incomoda, infecta, prure e torna impoluta a alma. É necessário entender que não dispomos de poder sobre a vida e as pessoas para dizer o que pode ou não ser feito. Podemos em muitas fases de nossas existências sermos o timoneiro que guia a nau, mas isso só poderá ser possível se habilitarmo-nos a pilotar a nossa jornada, receptivo ao aprendizado constante, sem imposições que ferem ao semelhante. Desta forma, o entendimento e o reconhecimento das nossas fragilidades potencializam-nos de certa maneira, porque além de demonstrarem sinais de humildade, efetiva aquilo a que somos ou nos propomos a ser: sementes (talvez) humanas, prontas para crescer e encantar o mundo. Bom dia! (texto de Clodoaldo Fernandes)
terça-feira, 27 de outubro de 2015
domingo, 25 de outubro de 2015
E a vida passa e o Tempo...
Há tanta
coisa para se pensar sobre a vida que passa. Diferentes olhares marcam a
passagem da vida. Esta vai se diluindo nas relações e memórias, encharcadas
pelas alegrias, tristezas e as não-alegrias-tristezas. Com o passar da vida
percebemos que há coisas mais importantes, mas que na maioria das vezes não as
buscamos. Estamos marcados pelos paradoxos e dicotomias, pelos entraves que
interrompem, adiam as múltiplas afetividades da vida...Mas também pelas fendas,
fissuras que sinalizam as oportunidades de tornar-se menos objetivado,
coisificado, líquido. Entendemos que a velhice chega, e com ela, na maioria das
vezes, as limitações. Contudo, o ser humano menos velho, possui delimitações
que o estaciona: o egoísmo é uma delas, o excesso de vaidade, idem. Esta mesma
marca do amadurecimento da vida traz uma espécie de poder sobre o não- velho: o
caminho percorrido com êxito (ou não), a busca da contemplação e reflexão (ou
não), simplicidade (menos frivolidade) e o aproveitamento dos valores que
enobrecem a alma e qualificam melhor as relações humanas ( ou não) . Com o
passar do Tempo, há também a possibilidade de visualizarmos o que (não) valeu a
pena; as pérolas que abrilhantaram a nossa vida pode ser também algo positivo e
os espinhos que nos feriram também. Por falar em Tempo, lembrei-me que ele tem
me feito rasgos na carne desde outrora. Quando criança, as marcas eram
cicatrizes de catapora, o primeiro sinal de marca corporal. Graças a varicela
hoje sou inquieto, foram os pruridos que constituíram-me e causaram-me os
vestígios que hoje trago. Na atualidade sou incomodado pelas coceiras,
confesso. Tenho muitas alergias. Ao deparar-me com a hipocrisia, por exemplo,
pruro-me a ponto de sangrar. A superficialidade do nosso tempo também faz o meu
corpo avermelhar-se, porém não tomo anti-histamínico porque gosto da altercação
entre o meu "eu" e o mundo causador da patologia. Essas limitações só
são possíveis porque somos humanos...E a vida passa... E passa (m) a vida... as
pessoas, as alegrias, as dores-alergias, as derrotas, as conquistas. Tudo é
efêmero na senda da vida... E a vida passa...Desde quando o humano teima
adentrar as portas do espaço terreno para lutar contra o Tempo, si mesmo e o
outro...A vida passa, o Tempo passa. Bom dia!
terça-feira, 26 de maio de 2015
Desalinhos em vida
Homem doce, moço bonito, pupilo de Dionísio...
Suas adjetivações etéreas substantivam-me...
Obrigado por existir entre as letras e poesias...
O lirismo exala de ti.
Palavras tortas saem de mim.
Elas não usam setas ...
De palavras nasceram os deuses no panteão.
Você é verbo-ação.
O seu lugar no mundo encanta a mim e os meus pensamentos não param, porque querem senti-lo.
Não sou o mesmo,desde quando o vi.
Não sou o mesmo, desde quando o ouvi.
Não sou o mesmo, desde quando o meu olfato sentiu o cheiro espargido de ti.
Não sou o mesmo...
Não quero ser o decifrável, o previsível.
Sou o movimento cíclico das contradições entre o dito e o não dito
O olhar doce que emana de ti é como o bálsamo pra minh'alma...
Alma, esfomeada pela poesia, apegada ao lirismo das coisas tortas.
Suas mãos são como rochas, contraditórias, fortes, mas que descansam o meu espírito derreado.
O seu sorriso é como a luz que cega e ao mesmo tempo ilumina o dia descompromissado dos mortais...
Oh! doce homem que a tudo estais atento!
Os seus gestos bem cuidados para o meu espírito é o refrigério e tão esperado alento...
Venhais com o teu hálito e aflais a minha carne tão necessitada de despudor e de arte...
Sou teu.
O meu corpo é teu.
Teu é o meu corpo.
Seu.
Eu.
Nós.
terça-feira, 13 de janeiro de 2015
As
feiras livres de Anápolis e a Vigilância Sanitária: caos ou descaso de quem?
Este texto tem como
intuito refletir e incitar as autoridades do município de Anápolis a tomar
providências legais em relação ao Feirão Coberto Capitão Armando, no bairro IAPC
no que tange à fiscalização sanitária e a devida prestação de serviços nas
demais feiras.
Para isso, lanço questionamentos duplos acerca
da higiene e fiscalização do comércio que acontece aos sábados naquele lugar, popularmente
chamado de a “feira do IAPC”. Primeiro, os feirantes possuem alguma noção de
higiene e prestação de serviços aos consumidores no que se refere ao manuseio
de dinheiro, refrigeração das carnes e a urbanidade com os clientes? Segundo, há alguma proposta por parte da Secretaria
de Meio Ambiente/ Diretoria de Agricultura ou Vigilância Sanitária em relação à
visita de veterinários nos diferentes estabelecimentos comerciais quanto à procedência
e manipulação de alimentos e a adequação das vestimentas?
No último sábado, dia
10 de janeiro, fui à feira que acontece no bairro IAPC. Para mim, era um dia
comum, como aquele em que as pessoas saem de casa para um passeio
(socialização) e algumas compras, embora, ir à feira não seja algo que aprecio
muito, devido ao excesso de barulho, fiz uma gentileza à minha mãe. Algo chamou-me
a atenção, a forma com que muitos feirantes manuseavam os alimentos nas ditas
“barracas” populares de legumes, verduras e produtos de origem animal, tais
como o queijo, a manteiga e a carne. Com um olhar atento, um pouco treinado, já
que sou pesquisador, compreendi que tanto alguns consumidores quanto alguns prestadores
de serviços, não sabem noções mínimas do que seja higiene sanitária em um local
público e por isso, aglomerado de pessoas.
Ao aproximar-me de uma banca
de queijos, observei a aparente filha da senhora dona do estabelecimento, ambas
não usavam luvas de manuseio para oferecer aos clientes os artefatos comestíveis
da barraca. Aguardei atento e pude ver que a moça e a senhora, davam o troco aos
fregueses e não se importavam ou pelo menos, não sabiam, que se tratava de uma
prática insalubre, uma vez que o dinheiro transporta milhares de agentes
nocivos aos seres humanos e que por sua vez, os alimentos estando contaminados,
podem carregar a brucelose, cuja bactéria causadora é eliminada no processo de
pasteurização do leite. Quanto chegou a minha vez, aguardei a moça dentro de
sua prática cotidiana e automática, atender-me pronta e educadamente. Após o
queijo ter sido ralado (note-se que a moça não lavou a mão sequer e/ou usou
luvas), pedi, por favor, que da próxima vez que voltasse à banca fosse
manipulado o queijo de maneira correta: usando luvas de proteção, ou deixando
uma pessoa para efetuar o troco.
No mesmo instante, de
maneira ríspida, fui replicado, pela atendente que afirmou – caso eu não
estivesse satisfeito, poderia procurar outra banca, pois ninguém ali naquele
recinto faz uso das normas técnicas que a Vigilância Sanitária exige (ou pelo
menos, tem/teria por obrigação exigir/fiscalizar). Trepliquei dizendo que
voltaria quantas vezes fossem necessárias e que a atendente usaria pelo menos
uma sacola quando fosse atender-me, porque caso contrário, denunciaria a
atitude dela no órgão competente. As pessoas olhavam-me como se fosse um
alienígena, ou seja, estava tão naturalizada essa prática social da qual não se
higieniza as mãos para atender o consumidor, que muitos estranharam a minha
reclamação. Continuei a circular pelos espaços da feira, em meio aos gritos de
supostas promoções e burburinhos, e então, constatei que os “açougues” repetiam
os mesmos métodos anti-higiênicos relatados acima.
Não menos pior que a
situação da banca do queijo, muitos produtos estavam fora do refrigerador nas
barracas , com mosquitos pairando sobre as carnes, linguiças, toucinhos e, alguns clientes desavisados,
tocando-as, como fazem em quase tudo no ambiente da feira. Poucos sabem que a
carne cuja procedência é imprecisa, pode provocar cisticercose e o ovo, a
salmonela. Assim, pergunto: onde estão os produtos de origem animal que para
serem comercializados precisam de rótulos e selos dos órgãos municipal,
estadual e federal? Fiscalizar as feiras é proteger a vida das pessoas, é uma
maneira de garantir saúde a quem consome e pelo que foi visto, não estava sendo
cumprida a lei que os nossos legisladores criam.
De acordo com a lei
complementar nº 279 de 11 de julho de 2012, em seu artigo primeiro, é dever do
município disciplinar o exercício da produção, comercialização na cidade de
Anápolis. Na lei complementar 096 de 28 de dezembro de 2004, ficam claras as
funções da polícia sanitária e os usos e atribuições de prestadores de serviços
e o órgão público. No artigo 17 desta lei, versa que é infração tudo aquilo que
desobedece e/ou é inobservado ao disposto das normas técnicas reguladoras que
zelam (ou deveriam zelar) pela saúde coletiva e individual. Neste sentido, se o
município cobra taxas e licenças dos ambulantes destas feiras, porque não
fiscaliza a maneira que a prestação de serviços é oferecida à população? Se há
fiscalização e educação pedagógica, com certeza a repetição de algo cultural e
de senso comum, como expor a carne fora da refrigeração, ou manusear alimentos
sem proteção adequada após receber dinheiro, tornar-se-ia algo do passado.
O que defendo é que antes da punição (se
houver, neste sistema público muitas vezes ineficiente e falho), haja uma
mudança cultural advinda da educação. Não basta que após este artigo chegar às
autoridades competentes da prefeitura de Anápolis, os veterinários (fiscais) se
desloquem até as feiras livres com uma suposta conscientização insossa, como a
que aconteceu, de acordo com o sítio da prefeitura, no dia 09 de fevereiro de
2011 (quase quatro anos atrás). Bem sabemos que somente a prática do diálogo pontual
nas feiras não surtirão efeitos pedagógicos, pois muitos estão concentrados em
seus afazeres laborais, isto é, entre ouvir o fiscal e faturar o “pão de cada
dia”, este último vem em primeiro lugar. Daí a importância de panfletos
educativos aos consumidores e prestadores feirantes e outros recursos
midiáticos.
Desta maneira, uma resposta dada de modo
eficiente à população Anapolina, além de verificar o que reclamo neste texto, seria
a criação de um curso de algumas horas que abrangessem noções mínimas de
higiene, procedência dos produtos e relações humanas. Sim, é preciso que muitos
feirantes saibam tratar os consumidores para que não aconteça de um feirante
sugerir que o cliente (no seu direito) compra em outro lugar porque foi
contrariado em sua falta de higiene ou falta de urbanidade.
Portanto, vale muito a
pena atentarmo-nos às diretrizes da Vigilância Sanitária dispostas em sítios da
internet, em relação à procedência dos produtos de origem animal: (carnes de
boi, porco e frango, pescados, ovos, mel, derivados de leite), pois estes devem
ter identificação do serviço de inspeção, com número do lote e validade,
composição nutricional, ingredientes, nome e endereço do fabricante da carne. Ainda
assim, não podemos deixar de prestar atenção se quem manipula os produtos toma
os seguintes cuidados que evitam doenças: protege o cabelo (boné, touca, rede,
lenço), não usa brincos, anéis e relógio, usa guarda-pó ou avental de cor clara
e limpo e mantém as mãos limpas, com unhas curtas, sem esmalte e sem ferimentos.
Texto publicado no jornal Diário da Manhã edição 13/01/15. Disponível em http://www.dmdigital.com.br/#!/view?e=20150113&p=22
quarta-feira, 3 de dezembro de 2014
Lembro-me do ano de 1997, quando passava
na porta da Uniana, futura Universidade Estadual de Goiás (1999) e sonhava em
fazer parte daquele espaço acadêmico. Entrei naquele ambiente e visualizava as
pessoas sempre correndo com os seus livros e saberes. Ainda que houvesse parado
de estudar regularmente em rede básica de educação, sempre tive muita
curiosidade em aprender e, instruir-se para mim se perfazia em todos os
sentidos, seja com a escuta do outro, a observância do mundo etc. Lia uma média
de 100 livros ao ano porque sempre fui muito fascinado pelo universo paralelo
que os livros proporcionam, embora leitor tardio, pois o primeiro livro lido foi
aos treze anos de idade. Ao terminar o ensino médio em 2004 no Colégio Estadual
José Ludovico de Almeida, cuja escola atualmente sou professor efetivo estadual
e após descanso de dois anos, resolvi cursar Letras, conquanto quisesse Letras/Francês,
segui Letras/Inglês, deixando a Psicologia (curso que me fascina e sempre foi o
meu sonho) em segundo plano. No ano de 2007 adentrara os portões da
Universidade Estadual de Goiás para dar início ao curso acadêmico na cidade de
Inhumas-GO, local que saíra com a família aos quatro anos de idade rumo à
Anápolis-GO. Estava inseguro e encantando ao mesmo tempo com tudo que divisava.
Conheci pessoas maravilhosas, dentre elas, Pedro, Leandro, Celina, Aline,
Sergio, Henrique. Com essas joias foram momentos de intensos risos e discussões
profícuas na praça defronte àquela instituição. O cheiro bucólico da cidade, o
café feito no coador de pano da dona Maria, o alho (que adoro) em neblina
matinal e o cheiro de pasto molhado quando chovia, até hoje inebriam os meus
sentidos. Confeccionei naquele ano inicial de curso o meu primeiro texto
acadêmico para o professor Me. Wilmar Faria sobre o filme “Os deuses devem
estar loucos”. Ao entregar a resenha ele disse-me algo que marcara para sempre
o meu pensamento –A sua escrita denota
que você tem muito potencial para fazer um mestrado. Sorri sentindo-me
importante, pois havia chegado na 41ª vaga do curso, era aluno de segunda
chamada no vestibular e isto era um rótulo social. Não dei muita importância
após o êxtase de sua fala e segui adiante. Um dia, foram comigo até a UFG
participar de evento na Faculdade de Ciências Sociais, os meus queridos amigos
Léo e Pedro. Ao ver a magnitude da UFG fiquei extasiado e pensei: quero um dia
estudar aqui. O tempo passou, transferi em 2008 para a cidade de Anápolis e
conheci a professora Dra. Keila Matida com quem tive o presente de conviver
alguns meses. Um dia, a docente em conversa deliciosa, como tantas outras nos
corredores da universidade, disse-me que seria ainda uma pessoa de sucesso e
que via um caminho de muita coisa boa trilhado por mim. Neste ínterim, queria
desistir do curso porque pensava não haver afinidade com o curso de Letras e a
professora Dra. Glaucia Vieira falou –Ah, não vá desistir do curso Clodoaldo,
porque você já é um professor. Aquelas palavras ecoaram abruptamente de tal
maneira, que não consegui responder nada. Também tive a honra de conhecer a
professora Dra. Ivonete Bueno que mostrou novo sentido para a área de Letras,
com as suas lentes discursivas foucaultianas atentas e transgressivas, percebi
que poderia ser “um mais” na vida –ela adorava citar Foucault. No dia da minha
defesa do TCC, antes de adentrar a sala a pesquisadora continuou –Será um
sucesso, não se preocupe, você compreende do que fala porque estudou. Realmente
ela sabia das coisas. Dentre tantas outras conversas, duas ficaram marcadas no
discurso da querida professora e agora amiga, quando disse-me –Clodoaldo ao
trafegar em Paris só vejo você sentado naqueles bancos, andando naquelas ruas e
contemplando a paisagem. Você vai muito longe, não te vejo aqui por muito tempo,
ouça o que digo. Diante do que foi dito eu somente sorria e os olhos brilhavam
como sempre pelo amor inexplicável por aquele país e aquela cidade. Lembro-me
de outro dia, ao despedir-se de mim momentos antes de embarcar/mudar-se para a
Irlanda, em Galway, Ivonete disse em uma sala na UEG –Você não deixe de
estudar, fazer o seu mestrado e depois o doutorado, porque não haverá lugar que
satisfaça a sua curiosidade em aprender. Não tenha medo porque ninguém será
páreo com você, te conheço e sei do que falo. Você é um ser que nasceu para trazer
brilho por onde passa e é isso que faz de você único. Emocionei-me muito com
aquelas palavras traduzidas em despedida. No ano de 2012, após passar por um
acirrado processo seletivo na UEG para a primeira turma de Mestrado em
Educação, Linguagem e Tecnologias, uma pessoa muito querida aceitou pesquisar
nas fronteiras proibidas comigo, era o professor Dr. Ary. Aprendi tanto com ele
nas trocas acadêmicas. O seu apoio e a maneira que me construía
identitariamente, dava-me a certeza que poderia seguir adiante. Concluí o curso
com muito êxito no ano de 2014, precisamente no dia 07 de março e sempre, em
todos os momentos, a mão amiga do meu querido Rogerio amparava as minhas
dúvidas e inseguranças em relação a tantas coisas da existência. Com ele
percebi também o que é generosidade. Como a sua história de vida é parecida com
a minha. Percebo que precisamos recusar muito o que somos para chegarmos onde
estamos. Entendi que crescer é uma força imperiosa que às vezes dói, dói porque
muitas pessoas podem também nos machucar, perseguir porque não acolhemos o dado
como natural nas nossas relações; questionamos tudo, queremos aprender. Poucos
compreendem sem o julgamento o que é não aceitar o que temos para buscar o que
queremos. Tive apoio de muitas pessoas que materializo aqui a gratidão neste
breve relato, alguns de minha família, poucos amigos e o meu querido tio Virgílio.
Sendo assim, para encerrar, quero comunicar muito feliz, que após concluir o
meu mestrado, pude ser aprovado em primeiro 6º lugar em mais um concurso
público, desta vez para docente de ensino superior na UEG e hoje, dia 25 de
novembro de 2014, sou presentado em lugar após três fases concorridíssimas,
para o curso de DOUTORADO em Linguística
na Universidade Federal de Goiás!!!!! Tenho muita gratidão e alegria a
quem me estendeu a mão amiga neste caminho cheio de pedras. Digo ainda que
quantas tiverem, as retirarei todas, mesmo que as minhas mãos precisem sangrar.
Helen, amiga querida, obrigado por tudo,
você é um dos presentes que a UEG me deu no curso!!!!
segunda-feira, 3 de novembro de 2014
ODE AO CU
Prazer, o meu nome é cu.
Não sei quando passei a
existir.
No começo, o verbo imperou: faça-se
a luz e o buraco se abriu.
Portas de distintos mundos...
Das floras, dos restos, dos septos.
Sou aquele que todo mundo inclui,
mas teme.
Sou o fétido, o indesejado, o
maculado.
Sou o cu democrático, orifício
de todo ser também.
Cu do corpo, cu do mundo, cu
dos trópicos.
Cus.
Cu anapolino, cu goiano, cu brasileiro.
Cu americano, cu japonês, cu
europeu.
Cu humano, cu bichano...
Cu fulano, cu sicrano, cu
beltrano.
Sou o cu gracinha, cu feinho e
cu lindinho.
Sou o cu que dá, o cu que
vende, o que empresta.
Tem cu, tem cu , tem cu.
Tem cu, tem cu , tem cu.
Sou ou estou cu?
Orifício policiado, buraco
cuspido, olho preterido.
Clô Fernandes
sábado, 25 de outubro de 2014
Os
nãos da existência
A
vida é um senão.
O
não sempre quis corporificar-se em minha vida.
Negativas
quando nasci, por isso pranteei.
As
entranhas da Terra não se abriram para mim.
Desde
tenra idade insistia brigar com os nãos.
Não
silêncios. Não palavras. Não pessoas. Não vidas.
Como
existem não indivíduos no meu mundo.
Os
não nomes não rompem com a vida.
Preferem
a morte: sim.
Nego
a palavra não.
Não
porque sou negativo, mas porque sou afirmativo.
Agora só vivo na vida com os sins das palavras: performatizo .
Agora só vivo na vida com os sins das palavras: performatizo .
Palavras-vivas.
Vozes-algozes. Vocábulos-atrozes.
A
vida é um monturo de nãos e um grão de sins.
Desfaço
os sambaquis da minha existência usando as pás assertivas.
Clô Fernandes